sábado, 9 de junho de 2012


 4026-2370 AEC − a desunião religiosa — como começou

“O homem é, por sua constituição, um animal religioso.” − Edmundo Burke, estadista irlandês do século 18
OS HUMANOS têm necessidade instintiva de adorar. The New Encyclopædia Britannica afirma que “tanto quanto os peritos tenham conseguido descobrir, jamais existiu nenhum povo, em parte alguma, em qualquer época, que não tivesse sido, em algum sentido, religioso”. Já bem desde o começo da humanidade, o homem e a mulher se voltaram logicamente em adoração a seu Criador. Voltaram-se para ele como a Autoridade que poderia oferecer-lhes orientação e conselho. Assim, para todos os fins e propósitos, o nascimento da religião na Terra coincidiu com a criação de Adão. De acordo com a cronologia bíblica, isto se deu no ano 4026 AEC.

Alguns talvez objetem ao uso do termo “criação de Adão”. Mas a teoria não-provada da evolução vem sofrendo, recentemente, alguns fortes abalos, mesmo da parte de seus apoiadores. Para obter informações adicionais, queira ver o livro A Vida Qual a Sua Origem? A Evolução ou a Criação?, editado pela Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados.

Hoje em dia, a pessoa não pode argumentar, à base de fatos, que o relato bíblico sobre uma origem comum para a humanidade é anticientífica. Um artigo da revista Newsweek, de 1988, informava que os geneticistas agora tendem a concordar que o homem moderno originou-se de uma única mãe. Cita o paleontólogo da Universidade de Harvard, S. J. Gould, como tendo dito que “todos os seres humanos, apesar das diferenças na aparência externa, são realmente membros de uma única entidade que teve uma origem bem recente, em um só lugar”. Acrescenta ele: “Há uma espécie de fraternidade biológica, que é muito mais profunda do que discerníamos até o presente.”

Tais fatos comprovam a exatidão da Bíblia. Isto indica que não existe motivo de duvidarmos de sua explicação sobre como se iniciou o conflito religioso.

Como Uma Única Religião Dividiu-se em Duas

The Encyclopedia of Religion (Enciclopédia de Religião) afirma que quase todas as religiões conhecidas possuem determinadas crenças que, ao passo que diferem nos pormenores, são surpreendentemente similares. À guisa de exemplo, elas crêem que a humanidade decaiu da posição original do favor divino, que a morte é desnatural, e que é preciso um sacrifício para recuperar-se o favor divino. Trata-se de forte evidência circunstancial de que todas as religiões da atualidade tiveram uma origem comum.

A Bíblia explica como isto se deu. Conta-nos que o primeiro homem e a primeira mulher rejeitaram a orientação de Deus e se voltaram para outra fonte de orientação e de conselho. Embora, evidentemente, eles não estivessem cônscios de Satanás e da rebelião deste contra Deus, assumiram um proceder independente e seguiram o conselho de uma criatura, representada por uma serpente, em vez de seguirem o Criador. A Bíblia posteriormente revelou que Satanás era a verdadeira voz por trás da desencaminhadora serpente. — Gênesis 2:16—3:24; Revelação 12:9.

Assim, o homem deixou a regência teocrática e estabeleceu seus próprios padrões quanto ao bem e o mal. Adão e Eva, por suas ações independentes, iniciaram a humanidade num proceder que resultaria em muitas religiões diferentes, todas elas constituindo a adoração falsa, em contraste com a verdadeira adoração praticada pelas fiéis testemunhas de Jeová no decorrer da História. Direta ou indiretamente, o beneficiário dessa adoração falsa tem sido o grande Adversário, Satanás. Assim, o apóstolo Paulo podia escrever: “As coisas sacrificadas pelas nações, elas sacrificam aos demônios, e não a Deus; e eu não quero que vos torneis parceiros dos demônios.” Ele passou a mostrar que só existem duas formas de adoração, dizendo: “Não podeis estar bebendo o copo de Jeová e o copo de demônios; não podeis estar participando da ‘mesa de Jeová’ e da mesa dos demônios.” — 1 Coríntios 10:20, 21.

Por conseguinte, a rebelião de Adão iniciou uma segunda forma de adoração, uma que colocava a criatura à frente do Criador. E o verdadeiro patrocinador dessa nova religião era o novo “deus” autonomeado, Satanás, o Diabo. — 2 Coríntios 4:4; 1 João 5:19.

Caim e Abel, os primeiros dois filhos de Adão e Eva, ofereceram sacrifícios ao Criador, indicando que ambos tinham inclinações religiosas. O desenrolar subseqüente dos eventos, porém, mostrou que não estavam unidos em sentido religioso. Isto se tornou evidente com menos de 130 anos de história da humanidade, quando um sacrifício apresentado por Abel foi aceito pelo Criador, ao passo que o de Caim foi rejeitado. Como é óbvio, Deus não se dispunha a aceitar simplesmente qualquer religião pessoal. Este fato deixou Caim irado e motivou-o a assassinar seu irmão. — Gênesis 4:1-12; 1 João 3:12.

Pela primeira vez na história humana, o ódio religioso manchou a Terra de sangue inocente. Não seria a última vez. “Provavelmente metade ou mais das guerras travadas atualmente ao redor do mundo são patentemente conflitos religiosos ou envolvem disputas religiosas”, comentou um colunista moderno de jornal.

Nos dias de Enos, sobrinho de Caim e de Abel, “se principiou a invocar o nome de Jeová”. (Gênesis 4:26) Visto que Abel já havia previamente começado a invocar o nome de Deus com fé, entende-se que esta posterior ‘invocação do nome de Jeová’ significa que as pessoas passaram a empregar tal nome de forma profana, ou dum modo degradante. Tratava-se dum caso patente de hipocrisia religiosa.

O judaico Targum [paráfrase] de Jerusalém, comenta: “Essa foi a geração em cujos dias começaram a errar, fazendo para si mesmos ídolos, e dando sobrenomes a seus ídolos, conforme o nome da Palavra do Senhor.” A idolatria, junto com o fingimento de representar a Deus, tem caracterizado desde então a religião falsa.

Em Judas 14, 15, lemos a respeito da profecia do fiel Enoque a respeito da humanidade idólatra daquele primeiro milênio. Disse ele: “Eis que Jeová veio com as suas santas miríades, para executar o julgamento contra todos e para declarar todos os ímpios culpados de todas as suas ações ímpias que fizeram de modo ímpio, e de todas as coisas chocantes que os pecadores ímpios falaram contra ele.” Tal profecia se cumpriu no segundo milênio da história do homem, quando grassava a religião falsa. A impiedade pode até ter incluído idolatrar os anjos que, em desobediência a Deus, tinham-se materializado na Terra e se casado com “as filhas dos homens”, produzindo uma raça híbrida de “poderosos da antiguidade, os homens de fama”. — Gênesis 6:4.

Noé, contudo, “achou favor aos olhos de Jeová” porque ele “andou com o verdadeiro Deus”. (Gênesis 6:8, 9) Ele e sua família, um total de oito adeptos da verdadeira religião, estavam em número muitíssimo inferior ao dos iníquos. Visto que a religião falsa e aqueles que a praticavam constituíam a ampla maioria, “a maldade do homem era abundante na terra”, e “a terra ficou cheia de violência”. (Gênesis 6:5, 11) Deus determinou trazer um dilúvio para destruir as pessoas que praticavam a religião falsa. Somente Noé e sua família sobreviveram, sob a proteção de Deus, razão suficiente para eles, depois disso, ‘construírem um altar a Jeová’, como um ato de adoração pura. (Gênesis 8:20) O Dilúvio tinha claramente identificado qual dos dois sistemas religiosos que existiam nos dias de Noé era verdadeiro, e qual era falso.

O precedente se baseia na premissa de que o registro da Bíblia é verídico.



Parte 4: 1513-607 AEC — uma nação colocada à parte, diferente de todas as outras

ESTE nascimento, acompanhado de trovões e relâmpagos, era auspicioso. A ocasião era 1513 AEC, e o lugar o monte Sinai, naquilo que, na época, era a Arábia, mas que atualmente é o Egito. Em vez do nascimento de um humano, tratava-se do nascimento duma nação!

Menos de um ano antes, eles eram uma sociedade patriarcal, de talvez três milhões de pessoas, escravizada ao Egito, a potência mundial. Agora eram um povo livre, um povo que seu Deus tinha decidido organizar numa nação — mas não um tipo qualquer de nação. Devia ser uma nação colocada à parte, diferente de qualquer nação que já tivesse existido antes, ou que viesse a existir no futuro.

‘Igreja e Estado’ — Mas com Uma Diferença

A tentativa de Ninrode de fundir a religião com o governo acabara em desastre. O que ocorria agora no monte Sinai era, em alguns aspectos, uma fusão similar. Daria mais certo?

Uma nação precisa de leis. Por conseguinte, deram-se aos israelitas dez leis básicas, comumente conhecidas como os Dez Mandamentos, bem como cerca de outros 600 regulamentos. (Êxodo 20:1-17) Era um código de leis baseado nas verdades fundamentais que sempre se aplicavam à religião verdadeira, e, ainda se aplicam.

Baseavam-se tais leis no já existente Código de Hamurábi? Alguns talvez pensem que sim, visto que Hamurábi, rei da primeira dinastia de Babilônia, governou-a bem mais de um século e meio antes de Israel tornar-se uma nação. Em 1902, descobriu-se seu código de leis, copiado numa estela que estivera originalmente no templo de Marduque, em Babilônia. O livro Documents From Old Testament Times (Documentos dos Tempos do Antigo Testamento) conclui, contudo: “Apesar das muitas similaridades, não há nenhuma base para se presumir que os hebreus tenham feito qualquer apropriação direta dos babilônios. Mesmo nos pontos em que as duas séries de leis pouco diferem na letra, elas diferem muito no espírito.”
Esse era apenas um modo em que tal nação diferiria das outras. Além disso, originalmente, ela não deveria ter qualquer governante humano. Seria dirigida por um Rei invisível, nos céus, o que tornava esta nação deveras diferente, dessemelhante de todas as outras. Não foi senão quase 400 anos depois que se introduziu uma dinastia de reis humanos. Mas, mesmo então, aquela nação era ímpar. Seu rei não afirmava ser Deus, nem descendente de Deus como, por exemplo, afirmavam os Faraós do Egito. Os reis de Israel simplesmente sentavam-se no “trono de Jeová”, de modo representativo. — 1 Crônicas 29:23.

As funções governamentais de Israel, envolvendo os processos legislativo, judicial e executivo, talvez nos lembrem de certos governos da atualidade. Mais uma vez, porém, havia profunda diferença. Isaías 33:22 explica: “Porque Jeová é nosso Juiz [ramo judicial], Jeová é o nosso Legislador [poder legislativo], Jeová é o nosso Rei [poder executivo].” Estas três funções governamentais achavam-se unificadas no Deus de Israel. Nem o rei daquela nação, nem seus juízes, nem seus sacerdotes, deviam ser monarcas absolutos. Todos estavam subordinados às leis e aos regulamentos do Deus a quem representavam, o que é bem diferente das ditaduras dos políticos e dos religiosos hodiernos.

Assim, ao passo que a fusão da Igreja com o Estado, nos dias de Ninrode, tinha sido uma fusão do governo humano com a religião falsa, o ocorrido no monte Sinai foi a união do governo divino com a religião verdadeira. Isto garantia melhores resultados.

Excluídos os Movimentos Ecumênicos

A falta de fé dos israelitas resultou em terem de peregrinar por 40 anos no deserto. Agora, em 1473 AEC, finalmente prestes a entrar em Canaã, a terra que seu Deus lhes prometera, lembrou-se a eles a sua obrigação de refletir a Sua glória como nação colocada à parte para o Seu serviço. Não devia haver nenhuma confraternização com os cananeus. Isso explica aquilo que uma obra de referência chama de “sua hostilidade para com seus vizinhos não-iaveístas, e a insistência na qualidade ímpar de Iavé”.

‘Mas, espere um minuto’, alguém pode objetar, ‘por que tal intolerância? Os cananeus podem ter sido bem sinceros. Ademais, não são todas as religiões apenas diferentes caminhos para se chegar ao mesmo Deus único?’ Antes de concordar, lembre-se dos efeitos negativos sofridos por certas pessoas na Terra antediluviana, repleta de violência, nos dias de Ninrode, quando se construía zigurates, e na atmosfera politeísta do Egito. É provável que algumas destas pessoas também fossem sinceras, mas isto não as fez deixar de colher as conseqüências de praticarem religiões obviamente inaceitáveis ao seu Criador. Era a religião cananéia tão ruim quanto estas outras haviam sido? Pondere os fatos revelados no quadro “A Religião de Canaã — Verdadeira ou Falsa?”, na página 20, e então julgue por si.

Claudicando Entre Duas Opiniões

Depois de entrarem na Terra Prometida, Josué, sucessor de Moisés, assumiu a liderança em combater a religião falsa. Mas após sua morte, os israelitas foram negligentes em prosseguir nisso, quando tomaram posse da terra. Passaram a seguir uma tolerante política de coexistência. Isto não lhes trouxe vantagem. Os cananeus tornaram-se como espinhos laterais, continuamente fustigando-os, repetidas vezes fazendo com que se desviassem da religião verdadeira. — Números 33:55; Juízes 2:20-22.

Por cerca de 300 anos depois disso, 12 juízes divinamente nomeados surgiram em cena, de tempos a tempos, a fim de livrar os reincidentes israelitas da escravidão à religião falsa. Estes incluíam homens bem-conhecidos, tais como Baraque, Gideão, Jefté e Sansão.

Daí, em 1117 AEC, ocorreu uma grande mudança na estrutura governamental, quando Saul foi entronizado como o primeiro rei humano de Israel. Foi sucedido no trono por Davi, que finalmente subjugou todos os inimigos de Israel na Terra Prometida, expandindo a nação até suas fronteiras divinamente fixadas. No reinado de Salomão, seu filho, Israel atingiu o pináculo da glória, gozando uma prosperidade que o colocava à parte de todos os seus vizinhos.

Mas com a morte de Salomão, quer em 998 AEC, quer em 997 AEC, assolou um desastre. A nação se rompeu em duas. Dez tribos, ao norte, foram depois disso conhecidas como Israel, e as duas tribos de Judá e de Benjamim, ao sul, como Judá. Embora afirmassem representar o Deus verdadeiro, nenhum dos 19 reis, sem contar Tibni, que se seguiram no reino setentrional, praticavam a religião verdadeira. (1 Reis 16:21, 22) Eles claudicavam, por assim dizer, entre duas opiniões, situação esta que levou a graves conseqüências nos dias do Rei Acabe. (Veja 1 Reis 18:19-40.) Ainda mais graves foram as conseqüências advindas em 740 AEC, quando Israel foi derrubado pelos assírios.

No ínterim, dentre os 19 reis de Judá, começando com Roboão, filho de Salomão, apenas um punhado deles praticava a adoração verdadeira. À medida que a nação oscilava entre reis bons e maus, também o povo vacilava entre a religião verdadeira e a falsa. As doutrinas da religião falsa, e as degradantes práticas das nações vizinhas, inclusive a adoração de Baal, tornaram-se cada vez mais evidentes nos lares do povo.
À medida que tais elementos “tornaram-se cada vez mais arraigados na fé israelita”, afirma The New Encyclopædia Britannica (A Nova Enciclopédia Britânica), “o povo começou a perder o conceito de sua própria exclusividade e de sua missão de serem testemunhas para as nações”. Isto levou aquela nação à ruína.

Obviamente, a ordem de manter-se separados dos cananeus visava proteger os israelitas e manter a pureza de sua adoração. Como nação que praticava a religião verdadeira, eles deviam apresentar um nítido contraste com os que não a praticavam. Mas vacilavam com demasiada freqüência. Por fim, em 607 AEC, os babilônios destruíram Jerusalém, e os habitantes sobreviventes foram levados ao cativeiro. Por 70 anos, sofreram as tristes conseqüências de terem abandonado a religião verdadeira. Babilônia, berço da religião falsa pós-diluviana, tinha triunfado sobre uma nação colocada à parte, diferente de todas as outras.
Precisava-se dum Governante Eficaz

Enquanto os israelitas praticavam a religião verdadeira, eles usufruíam de paz e segurança. A união do governo divino com a religião verdadeira trouxe-lhes benefícios de todo tipo. Todavia, o êxito deles era limitado. Se a paz e segurança usufruída por uma nação, por tempo limitado, havia de ser alcançada plenamente por todas as nações, era preciso algo mais. Para se alcançar verdadeiro êxito, era imperioso haver um governante — alguém capaz de prover o governo justo e a religião verdadeira. O que ou quem seria?

Cerca de 250 anos depois da queda de Jerusalém, nasceu um homem que, embora tivesse vida curta, faria um nome tanto para si como para sua nação. Seu pé pisaria em Babilônia e também no Egito, onde seria saudado como grande libertador. A respeito dele, The New Encyclopædia Britannica, com o benefício da percepção tardia deste fato, diria cerca de 23 séculos depois: “Não é inverídico afirmar que o Império Romano, [e] a disseminação do Cristianismo como religião mundial. . . foram todos, em certo grau, frutos de [sua] consecução.”


“A ruína duma nação começa nos lares de seu povo.” — Provérbio achanti (de Gana)

Representação do deus Baal, cuja adoração fazia com que os israelitas se desviassem da adoração verdadeira.


A Religião de Canaã — Verdadeira ou Falsa?

  “As escavações feitas na Palestina trouxeram a lume uma multidão de figuras de A[startéia] em todas as formas;. . . a maioria delas eram figuras pequenas e toscas, indício de que esta deidade era usada principalmente na adoração doméstica, sendo talvez usada no corpo das mulheres, ou colocada na alcova da casa. . . . As sensuais religiões da natureza, de A[startéia] e de Baal, agradavam ao povo comum. Naturalmente, era inevitável que ocorressem graves danos; as perversões sexuais em honra à deidade, a luxúria voluptuosa, e exuberância passional tornaram-se parte da adoração, e, mais tarde, chegaram ao lar.” — Calwer Bibellexikon (Léxico Bíblico de Calwer).

  “As festas religiosas tornaram-se uma celebração degradada do lado animal da natureza humana. Até os escritores gregos e romanos ficavam chocados com as coisas que os cananeus faziam, em nome da religião.” — The Lion Encyclopedia of the Bible (Enciclopédia Lion da Bíblia).

  “Dentre as práticas religiosas cananéias, faremos apenas menção aqui do sacrifício de crianças, pois as escavações têm comprovado diretamente isto. Em Gezer, bem como em Megido, a forma como os cadáveres de crianças eram emparedados. . . fala conclusivamente. . . sobre tal prática.” — Die Alttestamentliche Wissenschaft (Ciência do Antigo Testamento).

  “Em nenhum outro país tem-se achado um número relativamente tão grande de estatuetas da deusa nua da fertilidade, algumas distintamente obscenas. Em nenhum outro lugar o culto de serpentes aparece de modo tão forte. . . . As cortesãs sagradas e os sacerdotes eunucos eram excessivamente comuns. O sacrifício humano era bem conhecido. . . . Assim sendo, é bem fácil de entender a aversão sentida pelos seguidores do Deus-IHVH, quando confrontados com a idolatria cananéia.” — Recent Discoveries in Bible Lands (Recentes Descobertas nas Terras Bíblicas).



Parte 11: 2 AEC-100 EC — o caminho da fé, da esperança e do amor

“As maiores verdades são as mais simples: o mesmo acontece com os maiores de todos os homens.” — Autores ingleses Julius e Augustus Hare, do século 19.

CERCA de 320 anos depois da morte de Alexandre Magno, rei da Macedônia, nasceu um conquistador do mundo ainda maior do que ele. Diferia de Alexandre em dois grandes aspectos, conforme predito em Lucas 1:32, 33: ‘Ele será chamado Filho do Altíssimo, e não haverá fim do seu reino.’ Este Governante é Jesus Cristo, e ele estava destinado a permanecer vivo em mais do que as páginas poeirentas de livros de História.

Jesus era um homem simples, que levava uma vida simples. Ele não possuía um lar palaciano. Não se cercou de ricos e poderosos; nem possuía tesouros de bens terrestres. Jesus nasceu por volta de outubro de 2 AEC, numa despretensiosa família judia, sob circunstâncias bem simples, no vilarejo de Belém. A parte inicial de sua vida foi desprovida de acontecimentos destacados. Ele aprendeu a profissão de carpinteiro, “sendo, como era a opinião, filho de José”. — Lucas 3:23; Marcos 6:3.

Mesmo as pessoas que zombam da idéia de Jesus ser Filho de Deus não podem negar que o nascimento de Jesus introduziu uma nova era, nem alguém pode questionar com êxito a declaração feita pela World Christian Encyclopedia (Enciclopédia Mundial Cristã) de que “o Cristianismo se tornou a religião mais difundida e universal da História”.

Não Era Novo, mas Era Diferente

O cristianismo não era uma religião inteiramente nova. Suas raízes se aprofundam na religião dos israelitas, sendo nutrida pela Lei escrita de Jeová Deus. Mesmo antes de Israel se tornar uma nação, a adoração de Jeová já era praticada pelos seus antepassados Noé, Abraão e Moisés, e era, em realidade, uma continuação da mais antiga religião que existia, a adoração verdadeira do Criador, segundo praticada inicialmente no Éden. Mas, os líderes nacionais e religiosos de Israel permitiram que a religião falsa, com matizes babilônicos, penetrasse em sua adoração, e desta forma a poluísse. Como a World Bible (Bíblia Mundial) comenta: “A congregação judaica na época do nascimento de Jesus estava conspurcada por hipocrisias e saturada dum formalismo que obscurecia as subjacentes verdades espirituais proferidas pelos grandes profetas hebreus.”

Os ensinos de Jesus, quando comparados com as complexidades humanas adicionadas à fé judaica, primavam pela simplicidade. Paulo, um dos mais ativos missionários do cristianismo no primeiro século, mostrou isto quando falou das principais qualidades do cristianismo: “Permanecem a fé, a esperança, o amor, estes três; mas o maior destes é o amor.” (1 Coríntios 13:13) Outras religiões mencionam também ‘a fé, a esperança e o amor’, todavia, o cristianismo é diferente. Como?

Fé em Quem e no Quê?

Jesus sublinhou a necessidade de ‘exercer fé em Deus’, Aquele que ele descrevia como o Criador. (João 14:1; Mateus 19:4; Marcos 13:19) Assim, o cristianismo difere do jainismo e do budismo, ambos os quais rejeitam a idéia dum Criador, afirmando que o universo sempre existiu. E, visto que Cristo falou sobre “o único Deus verdadeiro”, ele, evidentemente, não cria numa multiplicidade de deuses e deusas verdadeiros como as religiões da antiga Babilônia, Egito, Grécia e Roma ensinavam, ou como o hinduísmo ainda ensina. — João 17:3.

O propósito divino, explicou Jesus, era que ele desse “sua alma como resgate em troca de muitos”, para “salvar o que estava perdido”, de modo que “todo aquele que nele exercer fé não seja destruído, mas tenha vida eterna”. (Marcos 10:45; Lucas 19:10; João 3:16; compare com Romanos 5:17-19.) A crença numa morte sacrificial a fim de realizar a expiação de pecados difere do xintoísmo, que se recusa a admitir que existe o pecado original ou inerente.

Jesus ensinou que só existe uma fé verdadeira. Ele aconselhou: “Entrai pelo portão estreito; porque larga e espaçosa é a estrada que conduz à destruição, e muitos são os que entram por ela; ao passo que estreito é o portão e apertada a estrada que conduz à vida, e poucos são os que o acham.” (Mateus 7:13, 14) O livro Imperial Rome (Roma Imperial) diz: “[Os primitivos] cristãos insistiam em que somente eles possuíam a verdade, e que todas as outras religiões . . . eram falsas.” Isto obviamente difere da atitude hindu-budista, que encara todas as religiões como tendo mérito.

Que Tipo de Esperança?

A esperança cristã se centraliza na promessa do Criador de que Seu governo solucionará os problemas mundiais. Assim, desde o começo do ministério de Jesus, em 29 EC, ele incentivou as pessoas a ‘ter fé nas boas novas’ de que ‘o reino de Deus se tinha aproximado’. (Marcos 1:15) Diferente das religiões orientais, tais como o Ch’õndogyo, o ensino de Jesus não destacou o nacionalismo como meio de realizar a esperança cristã. Com efeito, Jesus rejeitou todas as propostas de participar na política. (Mateus 4:8-10; João 6:15) Obviamente ele não concluiu, como alguns líderes judeus concluem, que “a humanidade precisa ajudar ativamente a Deus a trazer o Messias”.

A esperança cristã inclui a perspectiva de se usufruir a vida eterna na Terra sob condições justas. (Compare com Mateus 5:5; Revelação [Apocalipse] 21:1-4.) Não é isto algo simples e fácil de entender? Não para muitos cuja mente está anuviada pelo conceito budista do Nirvana, a que a obra The Faiths of Mankind (As Fés da Humanidade) se refere como “cessação” e, ainda assim, “não a aniquilação”. Este livro assevera que, na realidade, o Nirvana é “impossível de descrever”.

Amor — Por Quem e de que Espécie?

Jesus disse que o maior mandamento é: “Tens de amar a Jeová, teu Deus, de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de toda a tua mente, e de toda a tua força”. (Marcos 12:30) Quão diferente das religiões que dão máxima prioridade à salvação humana, enquanto desprezam os interesses divinos. Em segundo lugar, em importância, disse Jesus, acha-se o amor positivo para com o próximo. “Todas as coisas, portanto, que quereis que os homens vos façam”, aconselhou ele, “vós também tendes de fazer do mesmo modo a eles”. (Mateus 7:12; 22:37-39) Mas observe como isto difere do ensino negativo de Confúcio: “Não faças a outros o que não queres para ti mesmo.” Que amor considera superior, o da espécie que impede as pessoas de causar danos a você, ou o da espécie que as motiva a lhe fazer o bem?

“O primeiro teste de um homem verdadeiramente grande é sua humildade”, comentou o escritor inglês John Ruskin, do século 19. Jesus, ao oferecer humildemente a sua vida nos interesses do nome e da reputação de seu Pai, e, em segundo lugar, a favor do homem, demonstrou amor tanto a Deus como ao homem. Quão diferente isso é das aspirações egotistas à divindade por parte de Alexandre Magno, a respeito do qual diz a Collier’s Encyclopedia (Enciclopédia da Collier): “Por toda a sua vida, que ele repetidas vezes arriscou, não existe evidência alguma de que ele alguma vez tenha pensado no que aconteceria com seu povo após a sua morte.”

Ilustrando também o amor que ele tinha a Deus e ao homem, Jesus, diferente de seus contemporâneos hindus na Índia, não endossou um discriminatório sistema de castas. E diferente dos grupos judeus que permitiam que seus membros pegassem em armas contra os governantes impopulares, Jesus avisou seus seguidores de que “todos os que tomarem a espada perecerão pela espada”. — Mateus 26:52.

Fé Provada por Obras

A preocupação do cristianismo primitivo com a fé, a esperança e o amor, manifestava-se pela conduta. Ordenou-se aos cristãos que ‘pusessem de lado a velha personalidade’, comum à humanidade pecadora, e ‘se revestissem da nova personalidade, que foi criada segundo a vontade de Deus, em verdadeira justiça’. (Efésios 4:22-24) Eles fizeram isto. É interessante que o falecido Harold J. Laski, cientista político inglês, disse: “Por certo, o teste crucial de um credo não é a capacidade de aqueles que o aceitam anunciar sua fé; seu teste crucial é sua capacidade de mudar o comportamento deles no decurso de sua vida diária.”  — Compare com 1 Coríntios 6:11.

Os cristãos primitivos, imbuídos duma fé inabalável e duma esperança bem alicerçada, e motivados pelo verdadeiro amor, passaram a obedecer à ordem final de Jesus, dada a eles antes de sua ascensão ao céu: “Ide, portanto, e fazei discípulos de pessoas de todas as nações, batizando-as . . . , ensinando-as a observar todas as coisas que vos ordenei.” — Mateus 28:19, 20.

Em Pentecostes de 33 EC, o espírito de Deus foi derramado sobre 120 discípulos cristãos reunidos num sobrado em Jerusalém. Nascia a congregação cristã! Naquele dia, seus membros foram miraculosamente dotados da capacidade de falar em línguas estrangeiras, habilitando-os assim a comunicar-se com os judeus e com os prosélitos de outros países que se achavam em Jerusalém, assistindo a uma festa. (Atos 2:5, 6, 41) E, com que resultado? Num único dia, o número de cristãos pulou de cerca de 120 para mais de 3.000!

Jesus limitou sua pregação mormente aos judeus. Mas, pouco depois de Pentecostes, Pedro, apóstolo cristão, foi usado para abrir “O Caminho” para os samaritanos, que guardavam os primeiros cinco livros da Bíblia, e, mais tarde, em 36 EC, para todos os não-judeus. Paulo tornou-se um “apóstolo para as nações” e empreendeu três viagens missionárias. (Romanos 11:13) Foram assim formadas congregações, e elas floresceram. “O zelo deles em disseminar a fé não conhecia limites”, diz o livro From Christ to Constantine (De Cristo a Constantino), acrescentando: “O testemunho cristão era tanto amplo como eficaz.” No caso da perseguição contra os cristãos, o feitiço virou contra o feiticeiro, ajudando a disseminar a mensagem, assim como o vento atiça as chamas. O livro bíblico de Atos relata excitante história da incessante atividade cristã durante a juventude do cristianismo.

‘Esse não É o Cristianismo que Eu Conheço!’

É esta a sua reação ao ouvir esta descrição dos primeiros dias do cristianismo? Já verificou que, em vez de possuir forte fé, muitos cristãos professos, hoje em dia, estão repletos de dúvidas, inseguros quanto ao que crer? Já verificou que, em vez de esperança, muitos deles acham-se nos laços do temor, inseguros quanto ao futuro? E já verificou, como se expressou o satirista inglês Jonathan Swift, do século 18, que “temos bastante religião para fazer-nos odiar uns aos outros, mas não o bastante para que nos amemos uns aos outros”?

Paulo predisse este acontecimento negativo. “Lobos opressivos” — líderes que só seriam cristãos no nome — ‘surgiriam e falariam coisas deturpadas, para atrair a si os discípulos’. (Atos 20:29, 30) Qual seria a extensão disto? Nosso próximo número explicará isto.


Para as pessoas de fora, o cristianismo era mencionado como “O Caminho”. “Foi primeiro em Antioquia [provavelmente de 10 a 20 anos depois] que os discípulos, por providência divina, foram chamados cristãos.” — Atos 9:2; 11:26.


O cristão tem fé num Deus vivo.

A esperança cristã aguarda um restaurado paraíso terrestre.
O amor cristão é imparcial em ajudar outros a servir a Deus.



Parte 15: 1095-1453 EC — recorrer à espada

“Os homens altercam pela religião; escrevem por ela; lutam por ela; fazem tudo, menos viver por ela.” — Charles Caleb Colton, clérigo inglês do século 19.

O CRISTIANISMO, em seus primeiros anos, foi abençoado com crentes que viviam mesmo sua religião. Em defesa de sua fé, eles zelosamente brandiam “a espada do espírito, isto é, a palavra de Deus”. (Efésios 6:17) Mais tarde, porém, conforme ilustrado pelos eventos ocorridos entre 1095 e 1453, os cristãos nominais, que não viviam o verdadeiro cristianismo, recorreram a outros tipos de espada.

Por volta do sexto século, o Império Romano do Ocidente já estava destroçado. Tinha sido substituído pelo seu correspondente oriental, o Império Bizantino, tendo por capital Constantinopla. Mas suas respectivas igrejas, padecendo das mais estremecidas das relações, logo se viram ameaçadas por um inimigo comum, o domínio islâmico, que rapidamente se expandia.

A igreja Oriental compreendeu isto, no mais tardar, quando os muçulmanos, no sétimo século, capturaram o Egito e outras partes do império Bizantino, situadas na África do Norte.

Menos de um século depois, a Igreja Ocidental ficou chocada de ver o islã atravessar a Espanha, e penetrar na França, chegando a cerca de 160 quilômetros de Paris. Muitos católicos espanhóis converteram-se ao Islã, ao passo que outros adotaram costumes muçulmanos e abraçaram a cultura islâmica. “Amargurada com suas perdas”, afirma o livro Early Islam (O Islã Primitivo), “a Igreja trabalhava incessantemente, entre seus filhos espanhóis, para atiçar as chamas da vingança”.

Séculos depois, depois que os católicos espanhóis recuperaram a maior parte de suas terras, eles “se voltaram contra seus súditos muçulmanos e os perseguiram sem misericórdia. Obrigaram-nos a negar sua fé, expulsaram-nos do país, e tomaram medidas drásticas para desarraigar qualquer vestígio da cultura hispânico-islâmica ”.

Disposta a Lutar

Em 1095, o Papa Urbano II concitou os católicos europeus a tomar a espada literal. O Islã deveria ser deposto das terras santas do Oriente Médio, às quais a cristandade pretendia ter direitos exclusivos.
A idéia de uma guerra “justa” não era nova. Por exemplo, ela fora invocada na luta contra os muçulmanos da Espanha e da Sicília. E, pelo menos uma década antes do apelo de Urbano, afirma Karlfried Froehlich, do Seminário Teológico de Princeton, o Papa Gregório VII “visualizou uma militia Christi para lutar contra todos os inimigos de Deus, e já pensara em enviar um exército ao Oriente”.

A medida proposta por Urbano se devia, em parte, à resposta a um pedido de ajuda do imperador bizantino Aleixo. Mas visto que as relações entre as partes Oriental e Ocidental da cristandade pareciam estar melhorando, o papa também pode ter sido motivado pela possibilidade que isto oferecia de reunir as discordantes igrejas irmãs. De qualquer modo, ele convocou o Concílio de Clermont, que declarou que aqueles dispostos a empenhar-se neste empreendimento “sagrado” deviam receber indulgência plenária (a remissão de todos os castigos devidos ao pecado). A reação foi inesperadamente positiva. “Deus volt” (“Deus o quer!”) tornou-se o brado de guerra no Oriente e no Ocidente.

Iniciou-se uma série de expedições militares que abrangeu a maior parte de dois séculos.  De início, os muçulmanos pensavam que os intrusos eram bizantinos. Mas depois de compreenderem sua verdadeira origem, eles os chamaram de francos, o povo germânico do qual a França, mais tarde, derivou seu nome. Para enfrentar o desafio destes “bárbaros” europeus, cresceu entre os muçulmanos o sentimento de se fazer uma jihad, uma guerra ou luta santa.

O professor britânico Desmond Stewart aponta: “Para cada perito ou mercador que plantava as sementes da civilização islâmica por preceito e por exemplo, havia um soldado para o qual o islã era uma convocação para batalha.” Já na segunda metade do século 12, o líder muçulmano Nureddin tinha montado eficiente força militar por unificar os muçulmanos no norte da Síria e da Alta Mesopotâmia. Assim, “exatamente como os cristãos da Idade Média tomaram armas para promover a religião de Cristo”, prossegue Stewart, “os muçulmanos tomaram armas para promover a religião do Profeta”.

Naturalmente, a força motivadora nem sempre era promover as causas da religião. O livro The Birth of Europe (O Nascimento da Europa) comenta que, para a maioria dos europeus, as Cruzadas “ofereciam irresistível oportunidade de granjear fama, ou de fazer pilhagem, ou de moldar novos Estados, ou de governar países inteiros — ou somente de escapar da monotonia por meio de gloriosas aventuras”. Os mercadores italianos também viram uma oportunidade de estabelecer entrepostos comerciais nas terras do Mediterrâneo oriental. Mas não importa qual o motivo, todos, pelo visto, estavam dispostos a morrer por sua religião quer numa guerra “justa” da cristandade, quer numa jihad islâmica.

A Espada Traz Inesperados Resultados

“Embora as Cruzadas fossem dirigidas contra os muçulmanos no Oriente”, afirma The Encyclopedia of Religion (Enciclopédia de Religião), “o zelo dos cruzados foi exercido contra os judeus que moravam nos países de onde os cruzados foram recrutados, isto é, na Europa. Um lema popular entre os cruzados era a vingança pela morte de Jesus, e os judeus tornaram-se as primeiras vítimas. A perseguição contra os judeus ocorreu em Rouen, em 1096, seguida rapidamente por massacres em Worms, Mainz (Mogúncia) e Colônia.” Isto foi um precursor do espírito anti-semita dos dias do Holocausto da Alemanha nazista.
Os cruzados também aumentaram a tensão Leste-Oeste que crescia desde 1054, quando o Patriarca Miguel Cerulário, do Oriente, e o Cardeal Humberto, do Ocidente, excomungaram-se um ao outro. Quando os cruzados substituíram os clérigos gregos por bispos latinos nas cidades capturadas, o cisma Leste-Oeste veio a envolver o povo comum.

O rompimento entre as duas igrejas tornou-se completo durante a Quarta Cruzada, quando, de acordo com o ex-cânone anglicano de Canterbury (Cantuária), Herbert Waddams, o Papa Inocêncio III fez um “jogo duplo”. Por um lado, o papa mostrou-se indignado com o saque de Constantinopla. (Veja quadro na página 24.) Escreveu ele: “Como se pode esperar que a Igreja dos Gregos retorne à devoção da Sé Apostólica quando vê os latinos darem um exemplo de maldade e de fazer a obra do diabo, de modo que já agora, e com boa razão, os gregos os odeiam mais que aos cães.” Por outro lado, ele prontamente se aproveitou da situação por estabelecer um reino latino ali, sob um patriarca ocidental.

Depois de dois séculos de quase contínuas lutas, o Império Bizantino ficou tão debilitado que não conseguiu suportar as incursões dos turcos otomanos, os quais, em 29 de maio de 1453, finalmente capturaram Constantinopla. O império tinha sido derrubado, não apenas por uma espada islâmica, mas também pela espada brandida pela igreja-irmã do império, situada em Roma. A cristandade dividida tinha dado ao islã uma base conveniente para penetrar na Europa.

As Espadas da Política e da Perseguição

As Cruzadas fortaleceram a posição do papado no que tangia à liderança religiosa e política. Elas “deram aos papas um poder de controle sobre a diplomacia européia”, escreve o historiador John H. Mundy. Não demorou muito para que “a igreja fosse o maior governo da Europa . . . [capaz] de brandir mais poder político do que qualquer outro governo ocidental”.

Esta ascensão ao poder tornara-se possível quando o Império Romano do Ocidente entrou em colapso. A igreja ficou sendo o único poder unificador no Ocidente, e, por conseguinte, começou a desempenhar um papel político mais ativo na sociedade do que a Igreja Oriental, a qual, naquele tempo, ainda se achava sob forte governante secular, o imperador bizantino. A eminência política da igreja Ocidental dava crédito à sua pretensão do primado papal, idéia rejeitada pela igreja Oriental. Ao passo que admitia que o papa merecia honra, a igreja Oriental discordava de ser ele a autoridade final em questões de doutrina ou de jurisdição.
A Igreja Católica Romana, movida pelo poder político e por desorientada convicção religiosa, recorreu à espada para eliminar a oposição. A caça aos hereges tornou-se seu negócio. Os professores de História, Miroslav Hroch e Anna Skýbová, da Universidade de Karls, em Praga, Tchecoslováquia, descrevem como operava a inquisição, o tribunal especial que visava lidar com as heresias: “Contrário ao costume geral, os nomes dos informantes . . . não precisavam ser revelados.” O Papa Inocêncio IV lançou a bula “Ad extirpanda”, em 1252, que permitia a tortura. “Ser queimado vivo na estaca, o método usual empregado para matar os hereges, já no século 13, . . . tinha o seu simbolismo, dando a entender que a igreja, por ministrar tal tipo de castigo, não era culpada de derramar sangue.”

Os inquisidores castigaram dezenas de milhares de pessoas. Outros milhares foram queimados na estaca, levando o historiador Will Durant a comentar: “Dando-se o desconto devido ao historiador e permitido a um cristão, cumpre-nos colocar a Inquisição . . . no rol das manchas mais negras de que há registro na História, revelando uma ferocidade que se desconhece em qualquer animal selvagem.”

Os eventos da Inquisição fazem lembrar as palavras de Blaise Pascal, um filósofo e cientista francês do século 17, que escreveu: “Os homens jamais praticam o mal tão completa e alegremente como quando o fazem por convicção religiosa.” Na verdade, brandir a espada da perseguição contra pessoas de diferente convicção religiosa tem sido uma característica da religião falsa desde que Caim abateu violentamente a Abel. — Gênesis 4:8.

Dividida Pela Espada da Desunião

A dissensão nacionalística e as manobras políticas levaram, em 1309, à transferência da residência papal de Roma para Avinhão. Embora restaurada para Roma em 1377, contendas adicionais surgiram logo depois com a escolha dum novo papa, Urbano VI. Contudo, o mesmo grupo de cardeais que o elegeu também elegeu um papa rival, Clemente VII, que se fixou em Avinhão. As coisas tornaram-se ainda mais confusas com o início do século 15, quando, por um breve período, três papas governavam simultaneamente.

Esta situação, conhecida como o Cisma do Ocidente, ou o Grande Cisma, terminou com o Concílio de Constança. Este invocava o princípio do “movimento conciliar”, a teoria de que a derradeira autoridade eclesiástica reside nos concílios gerais, e não no papado. Assim, em 1417, o concílio pôde eleger Martinho V como novo papa. Embora unificada de novo, a igreja tinha ficado gravemente debilitada. Apesar das cicatrizes, contudo, o papado recusou-se a reconhecer qualquer necessidade de reforma. De acordo com John L. Boojamra, do Seminário Teológico Ortodoxo de São Vladimir, esta falha “constituiu a base para a Reforma do século dezesseis”.

Vivenciavam Sua Religião?

O Fundador do cristianismo instruiu seus seguidores a fazer discípulos, mas não lhes mandou empregar força física para fazê-lo. Com efeito, ele os avisou especificamente de que “todos os que tomarem a espada perecerão pela espada”. Similarmente, ele não instruiu seus seguidores a cometer abusos físicos contra qualquer pessoa que não mostrasse disposição favorável. O princípio cristão a ser observado era: “O escravo do Senhor não precisa lutar, porém, precisa ser meigo para com todos, qualificado para ensinar, restringindo-se sob o mal, instruindo com brandura os que não estiverem favoravelmente dispostos.” — Mateus 26:52; 2 Timóteo 2:24, 25.

A cristandade, por recorrer à espada literal da guerra, bem como às espadas simbólicas da política e da perseguição, evidentemente não estava seguindo a liderança Daquele que ela professava ter como seu Fundador. Já destroçada pela desunião, ela estava ameaçada de colapso total. O catolicismo romano era “Uma Religião Que Precisava Urgentemente de Reforma”. Mas, aconteceria tal reforma? Se assim fosse, quando? Da parte de quem? Nossa edição de 22 de agosto nos falará mais sobre isso.

O cemitério judeu em Worms, na Alemanha — um lembrete da Primeira Cruzada.

Bom Combate Cristão?

  Eram as Cruzadas o bom combate que os cristãos foram instruídos a travar? — 2 Coríntios 10:3, 4; 1 Timóteo 1:18.

  A Primeira Cruzada (1096-99) resultou na recaptura de Jerusalém e no estabelecimento de quatro estados latinos no Oriente: O Reino de Jerusalém, o Condado de Edessa, o Principado de Antioquia e o Condado de Trípoli. Uma autoridade citada pelo historiador H. G. Wells afirma sobre a captura de Jerusalém: “A carnificina foi terrível; o sangue dos vencidos correu pelas ruas, a ponto de os cavalos espadanarem sangue em sua marcha. Ao cair da noite, ‘soluçando por excesso de alegria’, os cruzados foram até ao Sepulcro e juntaram as suas mãos manchadas de sangue em oração.”

  A Segunda Cruzada (1147-49) teve início devido à perda do Condado de Edessa diante dos muçulmanos sírios em 1144; terminou quando os muçulmanos rechaçaram com êxito os “infiéis” da cristandade.

  A Terceira Cruzada (1189-92), realizada depois de os muçulmanos retomarem Jerusalém, teve como um dos seus líderes Ricardo I, “Coração de Leão”, da Inglaterra. Ela logo “desintegrou-se”, afirma The Encyclopedia of Religion, “pelos atritos, brigas e falta de cooperação”.

  A Quarta Cruzada (1202-4) foi desviada, por falta de fundos, do Egito para Constantinopla; prometeu-se ajuda material, em troca de ajuda para entronizar Aleixo, um exilado pretendente bizantino ao trono. “O [resultante] saque de Constantinopla pelos cruzados é algo que o Oriente Ortodoxo jamais esqueceu, nem perdoou”, afirma The Encyclopedia of Religion, acrescentando: “Se havemos de citar alguma data singular para o firme estabelecimento do cisma, a mais apropriada — pelo menos de um ponto de vista psicológico — é o ano de 1204.”

  A Cruzada das Crianças (1212) trouxe a morte de milhares de crianças alemãs e francesas, antes de sequer alcançarem sua destinação.

  A Quinta Cruzada (1217-21), a última sob controle papal, fracassou devido a liderança falha e à intervenção do clero.

  A Sexta Cruzada (1228-29) foi liderada pelo Imperador Frederico II, de Hohenstaufen, a quem o Papa Gregório IX havia anteriormente excomungado.

  A Sétima e a Oitava Cruzadas (1248-54 e 1270-72) foram lideradas por Luís IX, da França, mas malograram depois de sua morte na África do Norte.



 Do século 9 ao 16 EC — uma religião que precisava urgentemente de reforma

“Todo abuso precisa ser reformado.” — Voltaire, ensaísta e historiador francês do século 18.

OS CRISTÃOS primitivos não ensinavam o purgatório, não adoravam imagens, não honravam a quaisquer “santos” e não veneravam nenhuma relíquia. Não se empenhavam na política e não recorriam à guerra carnal. Mas, por volta do século 15, nada disso se aplicava mais a muitos dos que professavam ser imitadores deles.

“Hereges” Exigem Reforma

“As primeiras sementes da heresia [contra o catolicismo romano] surgiram na França e no norte da Itália, por volta do ano 1000”, afirma The Collins Atlas of World History (Atlas Collins da História Universal). Alguns dos chamados hereges iniciais só eram hereges aos olhos da igreja. É difícil, hoje, julgar com exatidão até que ponto os hereges individuais aderiam ao cristianismo primitivo. Todavia, é evidente que pelo menos alguns deles tentavam fazê-lo.

No início do novo século, o Arcebispo Agobard, de Lião, condenou a adoração de imagens e a invocação dos “santos”. Um arquidiácono do século 11, Berengário, de Tours, foi excomungado por questionar a transubstanciação, a afirmação de que o pão e o vinho utilizados na Missa católica se transformam no corpo e no sangue reais de Cristo. Um século depois, Pedro de Bruys e Henrique de Lausanne rejeitaram o batismo de bebês e a adoração da cruz. Por assim fazer, Henrique perdeu sua liberdade; Pedro perdeu a vida.

“Havia, em meados do século XII, considerável número de seitas heréticas nas cidades da Europa ocidental”, relata o historiador Will Durant. O mais significativo destes grupos era o dos valdenses. Eles se destacaram no fim do século 12 sob o mercador francês Pierre Valdès (Pedro Valdo). Entre outras coisas, discordavam da igreja quanto à adoração de Maria, a confissão aos sacerdotes, as Missas em favor dos mortos, as indulgências papais, o celibato sacerdotal, e o emprego de armas carnais. O movimento prontamente se espalhou por toda a França e o norte da Itália, bem como em Flandres, Alemanha, Áustria e Boêmia (Tchecoslováquia).

No ínterim, na Inglaterra, John Wycliffe, perito da Universidade de Oxford, mais tarde conhecido como “a estrela da manhã da Reforma inglesa”, condenava ‘a hierarquia ávida de poder’ do século 14. Por traduzir a Bíblia toda para o inglês, ele e seus associados a tornaram, pela primeira vez, disponível em geral aos cidadãos comuns. Os seguidores de Wycliffe foram chamados de lollardos. Os lollardos pregavam publicamente, distribuindo tratados e partes da Bíblia. Tal comportamento “herege” não agradava a igreja.
As idéias de Wycliffe foram divulgadas no exterior. Na Boêmia, elas captaram a atenção de Jan Hus (João Huss), reitor da Universidade de Praga. Huss questionava a legitimidade do papado e negava que a igreja tivesse sido fundada sobre Pedro. Depois duma controvérsia sobre a venda de indulgências, Huss foi julgado sob a acusação de heresia e queimado vivo na estaca, em 1415. De acordo com o ensino católico, as indulgências são uma provisão pela qual os castigos pelos pecados podem ser parcial ou totalmente redimidos, desta forma se abreviando ou eliminando o período de tempo em que a pessoa sofre castigo e purificação temporários no purgatório, antes de entrar no céu.

As exigências de reforma prosseguiram. Girolamo Savonarola, pregador dominicano italiano, do século 15, deplorava: ‘Os Papas e os prelados falam contra o orgulho e a ambição, e eles estão mergulhados neles até as orelhas. Pregam a castidade e mantêm amantes. Só pensam no mundo e nas coisas mundanas; não se preocupam nada com as almas.’ Até mesmo cardeais católicos reconheciam o problema. Em 1538, num memorando enviado ao Papa Paulo III, eles trouxeram à atenção dele os abusos paroquiais, financeiros, judiciais e morais. Mas o papado deixou de fazer as reformas patentemente necessárias, e isto provocou a Reforma protestante. Os primitivos líderes incluíam Martinho Lutero, Huldrych Zwingli, e João Calvino.
Lutero e o ‘Bingo do Século 16’

Em 31 de outubro de 1517, Lutero pôs fogo ao mundo religioso por pregar uma lista de 95 pontos de protesto — inclusive um sobre a venda de indulgências — na porta da igreja em Wittenberg.

A venda de indulgências teve origem durante as Cruzadas, quando elas eram concedidas aos crentes dispostos a arriscar a vida numa guerra “santa”. Mais tarde, foram estendidas a pessoas que davam apoio financeiro à igreja. Não demorou para que as indulgências se tornassem um método conveniente de angariar fundos para a construção de igrejas, mosteiros ou hospitais. “Os monumentos mais nobres da Idade Média foram financiados desta forma”, afirma Roland Bainton, professor de história religiosa, chamando as indulgências de “o bingo do século dezesseis”.

Lutero, com a língua afiada pela qual se tornou famoso, perguntou: “Se o papa possui realmente poder para liberar quem quer que seja do purgatório [à base de indulgências], por que, em nome do amor, ele não abole o purgatório por deixar todo o mundo sair de lá?” Quando lhe pediram que contribuísse para um projeto de construção romano, Lutero redarguiu que o papa “faria melhor se vendesse a basílica de São Pedro e desse o dinheiro aos pobres, que estão sendo tosquiados pelos vendedores de indulgências”.
Lutero também atacou o anti-semitismo católico, aconselhando: “Devemos usar, para com os judeus, não a lei do papa, mas a lei do amor de Cristo.” E, a respeito da adoração de relíquias, ele zombou: “Alguém afirma ter uma pena da asa do anjo Gabriel, e o Bispo de Mainz (Mongúncia) tem uma chama proveniente da sarça ardente de Moisés. E como é possível que dezoito apóstolos estejam sepultados na Alemanha quando Cristo só tinha doze?”

A igreja respondeu aos ataques de Lutero com a excomunhão. O Imperador do Santo Império Romano, Carlos V, cedendo à pressão papal, proscreveu Lutero. Isto gerou tão grande controvérsia que, em 1530, foi convocada a Dieta de Augsburgo, para debater o assunto. Fracassaram os esforços de conciliação, de modo que, por fim, foi lançada uma declaração básica da crença doutrinal luterana. Chamada de Confissão de Augsburgo, ela equivalia ao anúncio de nascimento da primeira igreja do protestantismo.

Zwingli e Lutero Discordam

Zwingli destacava a Bíblia como a autoridade derradeira e única para a igreja. Embora incentivado pelo exemplo de Lutero, ele objetava ser chamado de luterano, dizendo que aprendera o ensino de Cristo da Palavra de Deus, e não de Lutero. Com efeito, ele discordava de Lutero sobre certos elementos da Refeição Noturna do Senhor, bem como sobre o relacionamento correto do cristão para com as autoridades civis.

Os dois reformadores só se encontraram uma vez, em 1529, naquilo que o livro The Reformation Crisis (A Crise da Reforma) chama de “uma espécie de conferência de cúpula religiosa”. Diz o livro: “Os dois homens não se despediram como amigos, mas. . . um comunicado emitido no fim da conferência, assinado por todos os participantes, ocultava peritamente a extensão da brecha entre eles.”

Zwingli também teve problemas com seus próprios seguidores. Em 1525, um grupo tornou-se dissidente, discordando dele na questão da autoridade do Estado sobre a Igreja, que ele afirmava e eles rejeitavam. Chamados de anabatistas (“rebatizadores”), eles consideravam o batismo de bebês uma formalidade inútil, afirmando que o batismo era apenas para os crentes adultos. Eles também se opunham ao emprego de armas carnais, mesmo nas chamadas guerras justas. Milhares deles foram mortos devido às suas crenças.

O Papel de Calvino na Reforma

Muitos peritos consideram Calvino como o maior dos reformadores. Ele insistia que a igreja voltasse aos princípios originais do cristianismo. Todavia, um dos seus ensinos principais, a predestinação, faz-nos lembrar os ensinos da antiga Grécia, onde os estóicos diziam que Zeus determinava todas as coisas e que os homens tinham de resignar-se ao inevitável. É evidente que tal doutrina não é cristã.

Nos dias de Calvino, os protestantes franceses tornaram-se conhecidos como huguenotes, e eles foram duramente perseguidos. Na França, a partir de 24 de agosto de 1572, no Massacre do Dia de São Bartolomeu, as forças católicas abateram milhares deles, primeiro em Paris, e, em seguida, por todo o país. Mas os huguenotes também tomaram da espada e foram responsáveis pela matança de muita gente nas sangrentas guerras religiosas ocorridas na última parte do século 16. Assim, eles preferiram ignorar a instrução dada por Jesus: “Continuai a amar os vossos inimigos e a orar pelos que vos perseguem.” — Mateus 5:44.

Calvino tinha dado o exemplo, usando métodos para promover suas convicções religiosas que o falecido clérigo protestante Harry Emerson Fosdick descreveu como implacáveis e chocantes. Sob a lei canônica que Calvino introduziu em Genebra, 58 pessoas foram executadas e 76 foram banidas em questão de quatro anos; já no fim do século 16, calculadamente 150 pessoas tinham sido queimadas vivas na estaca. Uma delas foi Miguel Servet, médico e teólogo espanhol, que rejeitava a doutrina da Trindade, desta forma tornando-se o “herege” visado por cada um. As autoridades católicas o queimaram em efígie; os protestantes foram um passo significativo além, queimando-o vivo na estaca.

Por Fim, “Uma Realidade Temível”

Ao passo que concordavam com Lutero, em princípio, alguns dos supostos reformadores relutavam em agir. Um deles era o perito holandês Desidério Erasmo. Em 1516, ele se tornou o primeiro a editar o “Novo Testamento” no grego original. “Ele foi um reformador”, diz a publicação Edinburgh Review (Sumário de Edimburgo), “até que a Reforma se tornou uma realidade temível”.

Outros, contudo, foram adiante com a Reforma, e, na Alemanha e na Escandinávia, o luteranismo espalhou-se rapidamente. Em 1534, a Inglaterra desvencilhou-se do controle papal. A Escócia, sob John Knox, um líder da Reforma, logo a seguiu. Na França e na Polônia, o protestantismo obteve o reconhecimento legal antes de findar o século 16.

Sim, assim como Voltaire afirmara com tanta aptidão: “Todo abuso precisa ser reformado.” Mas Voltaire acrescentou as seguintes palavras qualificativas: “A menos que a reforma seja mais perigosa do que o abuso em si.” A fim de avaliar melhor a veracidade dessas palavras, certifique-se de ler “Protestantismo — É Realmente Uma Reforma?” em nosso próximo número.


Para obter evidência de que tais doutrinas e práticas eram desconhecidas dos cristãos primitivos, veja Raciocínios à Base das Escrituras, editado pela Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados, sob os assuntos “Batismo”, “Confissão”, “Cruz”, “Destino”, “Imagens”, “Maria”, “Missa”, “Neutralidade”, “Santos” e “Sucessão Apostólica”.


Significativamente, o termo “protestante” foi primeiramente aplicado na Dieta de Speyer, de 1529, aos seguidores de Lutero, que protestaram contra um decreto que concedia maior liberdade religiosa aos católicos do que a eles.


Martinho Lutero, nasceu na Alemanha em 1483, foi ordenado sacerdote aos 23 anos, estudou teologia na Universidade de Wittenberg, tornou-se professor de Escritura Sagrada em Wittenberg, em 1512, e morreu aos 62 anos.

Huldrych Zwingli, nasceu na Suíça cerca de dois meses depois de Lutero, foi ordenado sacerdote em 1506, e morreu em batalha aos 47 anos, como capelão protestante.

Kunstmuseum, Winterthur
João Calvino, nasceu 25 anos depois de Lutero e Zwingli, mudou-se, quando rapaz, da França para a Suíça, estabeleceu uma virtual igreja-estado em Genebra, e morreu aos 54 anos.


1530 em diante — protestantismo — é uma reforma?

“Inovar não é reformar.” — Edmund Burke, do século 18, membro do Parlamento da Grã-Bretanha
OS HISTORIADORES protestantes consideram a Reforma protestante como tendo restaurado o genuíno cristianismo. Os peritos católicos, por outro lado, afirmam que ela resultou em erros teológicos. No entanto, o que revela o espelho retrovisor da história religiosa? Foi a Reforma protestante realmente uma reforma, ou foi simples inovação, substituindo uma forma de adoração falha por outra?

A Palavra de Deus Ganha Condição Especial

Os reformadores protestantes sublinharam a importância das Escrituras. Eles rejeitaram as tradições, embora Martin Marty, editor-sênior da revista The Christian Century, diga que, neste último século, “cada vez mais protestantes se mostraram dispostos a ver a relação entre a Bíblia e a tradição”. Contudo, isto não se dava com seus “ancestrais na fé”. Para eles, “a Bíblia tinha uma condição especial, e a tradição ou a autoridade papal jamais poderiam igualá-la”.

Esta atitude acelerou o interesse na tradução, distribuição e estudo da Bíblia. Em meados do século 15 — mais de meio século antes de as rodas da Reforma começarem a girar — João Gutenberg, que também era alemão, como Lutero, forneceu ao protestantismo ainda em gestação um valioso instrumento. Tendo inventado um método de impressão com tipos móveis, Gutenberg produziu a primeira Bíblia impressa. Lutero viu grandes possibilidades neste invento, e chamou a impressão de “a última e melhor obra de Deus para disseminar a religião verdadeira por todo o mundo”.

Mais pessoas podiam então possuir a sua própria Bíblia, algo que a Igreja Católica não aprovava. Em 1559, o Papa Paulo IV decretou que nenhuma Bíblia podia ser publicada no vernáculo sem a aprovação da igreja, e isso a igreja se recusava a dar. Com efeito, em 1564, o Papa Pio IV declarou: “A experiência demonstra que, se se permitir de forma indiscriminada a leitura da Bíblia na língua vulgar, . . . disso surgirá mais dano do que bem.”

A Reforma produziu um novo tipo de “Cristianismo”. Substituiu a autoridade do papado pelo livre-arbítrio do indivíduo. A Missa católica foi substituída pela liturgia protestante, e as impressionantes catedrais católicas pelas igrejas protestantes, normalmente menos pretensiosas.

Benefícios Inesperados

A História nos ensina que os movimentos de natureza originalmente religiosa muitas vezes assumem conotações sociais e políticas. Foi isto que se deu com a Reforma protestante. Eugene F. Rice Jr., professor de História da Universidade de Colúmbia, explana: “Na Idade Média, a Igreja Ocidental tinha sido uma empresa européia. Na primeira metade do século dezesseis, ela se dividiu em grande número de igrejas territoriais locais . . . [sobre as quais] os governantes seculares exerciam controle predominante.” Isto resultou na “culminação da longa luta medieval entre a autoridade secular e a clerical. . . . O equilíbrio de poder oscilou decisiva e finalmente da igreja para o estado, e do sacerdote para o leigo”.

Para o indivíduo, isto significava maior liberdade, tanto religiosa como civil. Diferente do catolicismo, o protestantismo não tinha agência central para monitorar as doutrinas ou as práticas, permitindo assim amplo espectro de opiniões religiosas. Isto, por sua vez, gradualmente promoveu uma tolerância religiosa e atitude liberal que, no tempo da Reforma, ainda era inconcebível.

Maior liberdade liberou energias antes contidas. Alguns afirmam que este era o estímulo que faltava para promover os avanços sociais, políticos e tecnológicos responsáveis por nos lançarem na idade moderna. A ética de trabalho protestante se “traduziu tanto no Governo como na vida diária”, escreve o falecido autor, Theodore White. Ele definiu isto como “o credo de que o homem é responsável diretamente perante Deus por sua consciência e por seus atos, sem a intervenção ou intercessão de sacerdotes. . . . Se o homem trabalhasse arduamente, arasse fundo, não afrouxasse as mãos nem reduzisse o passo, e cuidasse da esposa e dos filhos, então a sorte, ou Deus, recompensaria seus esforços”.

Deveriam estes aspectos aparentemente positivos do protestantismo nos cegar quanto às suas falhas? A Reforma protestante também foi “a ocasião para enormes males”, diz a Encyclopædia of Religion and Ethics (Enciclopédia de Religião e Ética), acrescentando: “A era dos jesuítas e da Inquisição chegou ao fim . . . apenas para ser seguida por algo ainda mais baixo. Se havia muita ignorância honesta na Idade Média, existe muita falsidade organizada hoje em dia.”

“Falsidade Organizada” — Em Que Sentido?

Foi uma “falsidade organizada” porque o protestantismo prometeu a reforma doutrinal, mas não cumpriu o prometido. Muitas vezes, era a diretriz da igreja e não a inveracidade doutrinal, que suscitava a ira dos reformadores. Na maior parte, o protestantismo reteve as idéias e práticas religiosas, salpicadas de paganismo, do catolicismo. Como? Um notável exemplo é a doutrina da Trindade, que é a principal base para se ser membro do protestante Conselho Mundial de igrejas. O apego a tal doutrina é muito forte, embora The Encyclopedia of  Religion (Enciclopédia de Religião) admita que ‘exegetas e teólogos hoje em dia concordam que, em parte alguma da Bíblia, tal doutrina é explicitamente ensinada’.

Será que o protestantismo reformou uma forma corrupta de governo eclesial? Não. Antes, “prosseguiu adotando padrões autoritários do catolicismo medieval”, afirma Martin Marty, e “simplesmente rompeu com a instituição católica romana para formar as versões protestantes”.

O protestantismo também prometeu restaurar “a unidade na fé”. No entanto, esta promessa bíblica deixou de ser cumprida com o surgimento de muitas seitas protestantes divisórias. — Efésios 4:13.

Confusão Organizada — Por Quê?

Atualmente, em 1989, o protestantismo diluiu-se em tantas seitas e denominações que seria impossível determinar o número total delas. Antes de uma pessoa poder terminar de contar, novos grupos se teriam formado, ou outros teriam desaparecido.

Sem embargo, a World Christian Encyclopedia (Enciclopédia Mundial Cristã) faz o “impossível” por dividir a cristandade (em 1980) em “20.780 distintas denominações cristãs”, a ampla maioria das quais são protestantes. Elas incluem 7.889 grupos protestantes clássicos, 10.065 religiões indígenas predominantemente protestantes, não-brancas, 225 denominações anglicanas, e 1.345 grupos protestantes marginais.

Ao explanar como foi que surgiu esta confusa diversidade, chamada tanto de “sinal de saúde como de doença”, o livro Protestant Christianity (Cristianismo Protestante) menciona que “pode ser devido à criatividade humana e à finitude humana; ainda mais, pode ser devido a homens orgulhosos que tenham em demasiada conta sua própria perspectiva na vida”.

Quão verídico! Sem prestar suficiente consideração à verdade divina, homens orgulhosos oferecem novas alternativas para se obter a salvação, a libertação ou a realização pessoal. O pluralismo religioso não encontra apoio algum na Bíblia.

Ao promover o pluralismo religioso, o protestantismo parece dar a entender que Deus não dispõe de orientações fixas quanto ao modo como Ele deva ser adorado. É tal confusão organizada coerente com um Deus da verdade, a respeito do qual a Bíblia diz que ele “não é Deus de desordem, mas de paz”? Existe alguma diferença entre a mentalidade protestante, de que tanto se ouve falar, de a pessoa freqüentar a igreja de sua escolha, e a forma independente de pensar que conduziu Adão e Eva à crença errônea e às dificuldades subseqüentes? — 1 Coríntios 14:33; veja Gênesis 2:9; 3:17-19.

Ignorar a Condição Especial da Bíblia

Apesar da condição especial que os reformadores iniciais atribuíram à Bíblia, os teólogos protestantes mais tarde patrocinaram a alta crítica e, “assim, trataram o texto bíblico”, afirma Marty, “como tratariam qualquer outro texto literário antigo”. Eles não concederam “nenhuma condição especial à inspiração dos autores bíblicos”.

Por questionar a inspiração divina da Bíblia, por conseguinte, os teólogos protestantes minaram a fé naquilo que os reformadores consideravam ser a própria base do protestantismo. Isto abriu caminho para o ceticismo, o livre pensamento, e o racionalismo. Não sem motivos, muitos peritos consideram a Reforma como uma das principais causas do secularismo moderno.

Meteram-se na Política

Os frutos supracitados são uma clara evidência de que, apesar das possíveis boas intenções dos reformadores individuais, e de seus seguidores, o protestantismo não restaurou o verdadeiro cristianismo. Em vez de promover a paz, por meio da neutralidade cristã, o protestantismo se envolveu no nacionalismo.
Isto se evidenciou assim que se tornou realidade a divisão da cristandade em nações católicas e protestantes. As forças católicas e protestantes deixaram um rasto de sangue pela face da Europa continental, ao longo de uma dúzia ou mais de guerras. The New Encyclopædia Britannica (Nova Enciclopédia Britânica) as chama de “Guerras Religiosas atiçadas pela Reforma alemã e suíça dos anos 1520.” A mais notável destas foi a Guerra dos Trinta Anos (1618-48), que envolvia tanto as diferenças políticas como as religiosas entre os protestantes e os católicos alemães.

O sangue também jorrou na Inglaterra. Entre 1642 e 1649, o Rei Carlos I travou guerra contra o Parlamento. Visto que a maioria dos oponentes do Rei pertencia à ala puritana da Igreja Anglicana, a guerra é muitas vezes mencionada como a Revolução Puritana. Terminou com a execução do Rei e com o estabelecimento de uma comunidade puritana momentânea, sob Oliver Cromwell. Embora esta Guerra Civil inglesa não fosse primariamente uma luta religiosa, os historiadores concordam que a religião era um dos fatores determinantes na escolha do lado.

Durante esta guerra, surgiu o grupo religioso conhecido como Amigos, ou Quacres. O grupo enfrentou tenaz oposição de seus “irmãos” protestantes. Várias centenas de membros morreram na prisão, e milhares sofreram indignidades. Mas o movimento se espalhou, até mesmo às colônias britânicas na América, onde, em 1681, Carlos II forneceu uma carta a William Penn para fundar uma colônia quacre, que mais tarde se tornou o estado de Pensilvânia.

Os quacres não eram os únicos que buscavam fazer conversos no exterior, pois outras religiões já haviam feito isso antes. Agora, contudo, depois da “Inovação” protestante, os católicos, junto com grande número de grupos protestantes, começaram a intensificar seus esforços para levar a mensagem da verdade e da paz de Cristo aos “descrentes”. Mas, quão irônico isso era! Como “crentes”, tanto os católicos como os protestantes não conseguiam concordar quanto a uma definição comum da verdade divina. E certamente fracassaram em demonstrar paz e união fraternas. Em vista desta situação, o que se poderia esperar “Quando ‘Cristãos’ e ‘Pagãos’ Se Encontraram”? Leia a parte 18 em nosso próximo número.


Esta obra de referências, editada em 1982, tinha projetado que, em 1985, haveria 22.190, dizendo: “O atual aumento líquido é de 270 novas denominações por ano (5 novas por semana).”

Os Primeiros Filhos da Reforma

  COMUNIDADE ANGLICANA: 25 igrejas autônomas e 6 outros organismos que partilham doutrinas, diretrizes, e liturgia com a Igreja Anglicana, e que reconhecem a liderança titular do Arcebispo de Cantuária. The Encyclopedia of Religion diz que o anglicanismo “mantém a fé na sucessão apostólica dos bispos e retém muitas práticas anteriores à Reforma”. O ponto central de sua adoração é The Book of Common Prayer (O Livro de Liturgia Comum), “a única liturgia no vernáculo do período da Reforma que ainda é usada”. Os anglicanos nos Estados Unidos, que romperam com a Igreja Anglicana e formaram a Igreja Episcopal protestante, em 1789, mais uma vez romperam com a tradição, em fevereiro de 1989, empossando a primeira mulher como bispo da história anglicana.

  IGREJAS BATISTAS: 369 denominações (1970) que a originaram dos anabatistas do século 16, os quais sublinhavam o batismo de adultos por imersão. The Encyclopedia of Religion diz que os batistas têm “achado difícil manter a unidade organizacional ou teológica”, acrescentando que “a família batista nos Estados Unidos é grande, . . . mas, como se dá em muitas outras famílias grandes, alguns membros não falam com outros membros”.

  IGREJAS LUTERANAS: 240 denominações (1970), jactando-se de maior total de membros do que qualquer outro grupo protestante. Acham-se “ainda um tanto divididos no sentido de linhas étnicas (alemães, suecos, etc.)”, afirma The World Almanac and Book of Facts 1988 (Almanaque Mundial e Livro de Fatos 1988), acrescentando, contudo, que as “principais divisões são entre fundamentalistas e liberais”. A divisão dos luteranos em campos nacionalísticos tornou-se bem patente na II Guerra Mundial, quando, como diz E. W. Gritsch, do Seminário Teológico Luterano, dos EUA, “pequena minoria de pastores e congregações luteranos [na Alemanha] resistiram a Hitler, mas a grande maioria dos luteranos permaneceu em silêncio ou cooperou ativamente com o regime nazista”.

  IGREJAS METODISTAS: 188 denominações (1970), que surgiram dum movimento dentro da Igreja Anglicana, fundado em 1738 por John Wesley. Após a morte dele, ela rompeu como grupo separado; Wesley definiu um metodista como “alguém que vive de acordo com o método delineado na Bíblia”.
  IGREJAS REFORMADAS E PRESBITERIANAS: As igrejas reformadas (354 denominações, em 1970) em doutrina são calvinistas, em vez de luteranas, e consideram-se como a “Igreja Católica, reformada”. O termo “presbiteriano” designa um governo eclesial por parte de presbíteros; todas as Igrejas presbiterianas são igrejas reformadas, mas nem todas as igrejas reformadas têm uma forma presbiteriana de governo.


 Do século 15 em diante — quando “cristãos” e “pagãos” se encontraram

“A religião deve estar no coração, e não nos joelhos.” — D. W. Jerrold, teatrólogo inglês do século 19.

A ATIVIDADE missionária, um marco distintivo do cristianismo primitivo, harmonizava-se com a ordem de Jesus de ‘fazer discípulos de pessoas de todas as nações’ e de ser testemunhas dele “até à parte mais distante da terra”. — Mateus 28:19, 20; Atos 1:8.

No século 15, a cristandade empreendeu um programa global de conversão dos “pagãos”. Que tipo de religião praticavam estes “pagãos” até aquele tempo? E será que qualquer conversão subseqüente ao “cristianismo” tocou-lhes o coração, ou apenas os fez dobrar os joelhos em submissão formal?

Na África, existem calculadamente 700 grupos étnicos ao sul do Saara. Originalmente, cada um deles possuía sua própria religião tribal, embora as similaridades entre elas revelem uma origem comum. Na Austrália, nas Américas, e nas ilhas do Pacífico, podem-se encontrar dezenas de outras religiões indígenas.
A maioria delas crê num único deus supremo, e, ainda assim, politeisticamente, dão margem a amplo número de deidades menores — deuses da família, do clã, ou comunais. Um estudo da religião asteca alista mais de 60 nomes de deidades distintas e inter-relacionadas.

Na África e nas Américas, pessoas que adotam as mais “primitivas” religiões crêem numa figura sobrenatural conhecida como o Trapaceiro. Às vezes descrito como o criador cósmico, outras vezes como o rearranjador da criação, ele é sempre encarado como figura ardilosamente enganosa e cobiçosa, embora não necessariamente maliciosa. Os índios navajos norte-americanos afirmam que ele ordenou a morte; a tribo de oglala lacota ensina que ele é um anjo decaído que fez com que os primeiros humanos fossem banidos do paraíso por lhes prometer uma vida melhor em outra parte. Diz The Encyclopedia of Religion (Enciclopédia de Religião) que o Trapaceiro muitas vezes aparece em “histórias da criação”, atuando “em oposição a uma deidade-criador espiritual”.

Como reminiscências de Babilônia e do Egito, algumas religiões nativas ensinam uma trindade. O livro The Eskimos (Os Esquimós) afirma que o Espírito do Ar, o Espírito do Mar e o Espírito da Lua formam uma trindade que “em última análise, controlava praticamente tudo no meio ambiente esquimó”.

Humanos — “Espiritualmente Indestrutíveis”

Ronald M. Berndt, da Universidade da Austrália Ocidental, informa-nos que os aborígenes australianos crêem que o ciclo da vida “prossegue depois da morte, do físico para o inteiramente espiritual, retornando, no devido curso, à dimensão física”. Isto significa que “os seres humanos são espiritualmente indestrutíveis”.
Certas tribos africanas acreditam que, depois da morte, as pessoas comuns se tornam fantasmas, ao passo que as pessoas de destaque se tornam espíritos ancestrais, que devem ser honrados e rogados, como líderes invisíveis da comunidade. De acordo com os manus, da Melanésia, o fantasma dum homem ou dum parente próximo continua a supervisionar a sua família.

Alguns índios americanos acreditavam que o número de almas era limitado, necessitando que elas “reencarnassem alternadamente, primeiro num humano, e então quer num ser espiritual, quer num animal”. Explica The Encyclopedia of Religion: “A morte humana liberava uma alma para um animal ou um espírito, e vice-versa, ligando os humanos, os animais e os espíritos num ciclo de mútua dependência”.

Assim, os primeiros exploradores ficaram surpresos de verificar que os pais esquimós eram relapsos em disciplinar seus filhos, até mesmo se dirigindo a eles em termos tais como “mãe” ou “avô”. O autor Ernest S. Burch Jr. explica que isto se dava porque o filho tinha recebido o mesmo nome que o parente indicado pelo termo usado, e um pai esquimó naturalmente “evitava a idéia de castigar sua avó, mesmo que ela tivesse agora se mudado para o corpo de seu filho”.

O “além” era representado por algumas tribos indígenas norte-americanas como um campo de boa caça, para onde tanto os humanos como os animais iam, ao morrer. Ali, eles eram reunidos com os parentes queridos, mas também se viam confrontados com anteriores inimigos. Alguns índios arrancavam o escalpe de seus inimigos, depois de matá-los, pelo visto crendo que isto impedia que os inimigos entrassem no mundo espiritual.

Será que a crença predominante entre as religiões nativas, sobre alguma forma de vida após a morte, prova que a cristandade está certa ao ensinar que os humanos possuem alma imortal? De forma alguma. No Éden, onde a religião verdadeira teve seu início, Deus nada disse a respeito da vida após a morte; ele apresentou a perspectiva de vida eterna em contraste com a morte. A idéia de que a morte é uma porta de acesso para uma vida melhor foi fomentada por Satanás e foi, mais tarde, ensinada na Babilônia.

Necessidades Humanas ou Interesses Divinos?

A ênfase das religiões nativas tende a ser na segurança pessoal, ou no bem-estar comunal. Assim, Ronald Berndt escreve sobre a religião dos primitivos aborígenes australianos: “[Ela] refletia as variáveis preocupações das pessoas na vida cotidiana. Focalizava-se nas relações sociais, nas crises da existência humana, e nas questões práticas de sobrevivência.”

Feitas para lidar apenas com tais necessidades humanas são as formas de adoração conhecidas como animismo, fetichismo, e xamanismo, existentes em várias sociedades, em diversas combinações, e em diferentes graus de intensidade.

O animismo atribui uma vida consciente e um espírito residente aos objetos materiais, tais como plantas e pedras, e até mesmo aos fenômenos naturais, como trovoadas e terremotos. Pode também incluir a idéia de que existem espíritos desencarnados que exercem uma influência, quer benigna, quer maligna, sobre os vivos.

Fetichismo provém duma palavra portuguesa às vezes usada para descrever objetos que se julga possuírem poderes sobrenaturais, e que oferecem a seus donos proteção ou ajuda. Assim, os exploradores portugueses utilizavam o termo para designar os talismãs e os amuletos que eles acharam os africanos ocidentais usando em sua religião. O fetichismo, estando intimamente relacionado com a idolatria, assume muitas formas. Alguns índios americanos, por exemplo, atribuíam poderes sobrenaturais às penas, considerando-as veículos eficazes para fazer “voar” orações ou mensagens em direção ao céu.

O xamanismo, de um termo tunguso-manchu que significa “aquele que sabe”, centraliza-se no xamã, uma pessoa supostamente capaz de curar e de comunicar-se com o domínio espiritual. O pajé, curandeiro, feiticeiro — seja lá qual for a palavra que queira usar — afirma garantir a saúde ou restaurar poderes procriativos. O tratamento talvez exija, como o faz no caso de algumas tribos das florestas sul-americanas, que fure os lábios, o septo nasal, ou os lóbulos das orelhas, que pinte o corpo, ou que use certos adornos. Ou talvez lhe mandem usar estimulantes e narcóticos, tais como o fumo e folhas de coca.

Sendo fracas em doutrinas, as religiões nativas não conseguem transmitir conhecimento exato sobre o Criador. E, por elevarem as necessidades humanas acima dos interesses divinos, elas privam a Ele do que lhe é devido. Assim, à medida que a cristandade começava sua obra missionária moderna, a pergunta que surgiu foi: Será que os “cristãos” poderão atrair os corações “pagãos” para mais perto de Deus?

No século 15, a Espanha e Portugal iniciaram um programa de exploração e de expansão colonial. À medida que tais potências católicas descobriam novas terras, a igreja passou a converter os habitantes nativos delas, condicionando-os a aceitar seu novo governo “cristão”. As bulas papais concediam a Portugal direitos missionários na África e na Ásia. Daí, com o descobrimento da América, o Papa Alexandre VI traçou uma linha imaginária no meio do Atlântico, dando à Espanha direitos a oeste, e a Portugal a leste.

No ínterim, os protestantes estavam muito ocupados, garantindo sua própria posição contra o catolicismo, para pensar em converter outros, nem tinham os reformadores protestantes instado com eles para que fizessem isso. Lutero e Melanchthon criam, pelo visto, que o fim do mundo estava tão próximo que era tarde demais para alcançar os “pagãos”.

No século 17, contudo, um movimento protestante chamado pietismo começou a desenvolver-se. Sendo um produto da Reforma, destacava a experiência religiosa pessoal acima do formalismo e sublinhava a leitura da Bíblia e o compromisso religioso. Sua “visão duma humanidade necessitada do evangelho de Cristo”, como certo escritor o descreveu, por fim ajudou a alçar o protestantismo a bordo do “navio” da atividade missionária em fins do século 18.

De cerca de um quinto da população do mundo, em 1500, a proporção de professos cristãos tinha aumentado para cerca de um quarto, por volta de 1800, e para cerca de uma pessoa em cada três, em 1900. Um terço do mundo era então considerado “cristão”!

Fizeram Realmente Discípulos Cristãos?

Vestígios da verdade, encontrados nas religiões nativas, são ofuscados pelos muitos elementos de falsidade babilônica, mas isto se dá igualmente com o cristianismo apostatado. Assim, esta herança religiosa comum fez com que fosse muito fácil os “pagãos” se tornarem “cristãos”. O livro The Mythology of All Races (A Mitologia de Todas as Raças) afirma: “Nenhuma região da América parece ter fornecido tantas, ou tão notáveis analogias, ao ritual e ao simbolismo cristãos como fez a dos maias.” A veneração da cruz e outras similaridades de ritual “promoveram a mudança de religião, com um mínimo de fricção”.

Os africanos — por cerca de 450 anos regularmente seqüestrados pelos “cristãos” e trazidos para o Novo Mundo, para servirem de escravos — também puderam mudar de religião “com um mínimo de fricção”. Visto que os “cristãos” veneravam os falecidos “santos” europeus, que objeção se poderia mencionar contra a adoração dos espíritos dos ancestrais africanos por parte dos “cristãos pagãos”? Assim, The Encyclopedia of Religion comenta: “O vodu . . . , uma religião sincretista ajuntada das religiões da África Ocidental, da feitiçaria, da religião cristã, e do folclore . . . , tem-se tornado a real religião de muitos no Haiti, inclusive daqueles que são católicos nominais”.

O Concise Dictionary of the Christian World Mission (Dicionário Conciso da Missão Cristã Mundial) admite que a conversão da América Latina e das Filipinas foi muito superficial, acrescentando que “o Cristianismo destas regiões, hoje em dia, é crivado de superstição e de ignorância”. Para os astecas, os maias e os incas, “a ‘conversão’ simplesmente significava a adição de mais uma deidade ao seu panteão”.
A respeito dos povos akan de Gana e da Côte d’Ivoire, Michelle Gilbert, do Museu Peabody de História Natural, diz: “A religião tradicional prossegue porque, para a maioria das pessoas, ela é entendida como o mais eficaz sistema de crença, um sistema que continua a dotar o mundo de significado.”

M. F. C. Bourdillon, da Universidade de Zimbábue, fala da “mobilidade religiosa” entre os membros da religião chona, explicando: “As várias formas de Cristianismo, junto com os vários cultos tradicionais, provêem todos um conjunto de respostas religiosas dentre as quais um indivíduo pode escolher, dependendo das necessidades dele ou dela naquele momento.”

Mas, se os “cristãos pagãos” se caracterizam pela superficialidade, ignorância, superstição e politeísmo; se julgam as religiões tradicionais como mais eficazes do que o cristianismo; se consideram a religião apenas uma questão de conveniência ou de oportunismo, permitindo que mudem de uma para outra conforme as circunstâncias determinem, diria o leitor que a cristandade fez verdadeiros discípulos cristãos?

Se não São Discípulos, O Que São?

Na verdade, os missionários da cristandade estabeleceram centenas de escolas para educar os analfabetos. Construíram hospitais para curar os doentes. E, até certo ponto, promoveram o respeito pela Bíblia e seus princípios.

Mas, será que os “pagãos” foram nutridos com alimento espiritual sólido da Palavra de Deus, ou apenas com as migalhas do cristianismo apóstata? Foram rejeitadas as crenças e as práticas “pagãs”, ou apenas envoltas em trajes “cristãos”? Em suma, têm os missionários da cristandade ganhado corações para Deus ou apenas obrigado os joelhos “pagãos” a dobrar-se diante de altares “cristãos”?

Uma pessoa que se converteu ao cristianismo apóstata acrescenta a seus anteriores pecados de ignorância os novos pecados do cristianismo hipócrita, desta forma duplicando sua carga de culpa. Assim, para a cristandade, são apropriadas as palavras de Jesus: “Vós percorreis de uma parte para outra o mar e a terra, para fazerdes um único converso, e, então, vós o tornais duas vezes mais propício para a destruição do que vós mesmos.” — Mateus 23:15, Phillips.

A cristandade tem claramente falhado em enfrentar o desafio de fazer discípulos cristãos. Tem ela agido melhor ao enfrentar o desafio da mudança mundial? Em nossa próxima edição, o artigo “A Cristandade Tenta Sobrepor-se às Mudanças Mundiais” responderá essa pergunta.




 Do século 17 ao 19 — a cristandade tenta sobrepor-se às mudanças mundiais

“A Filosofia e a religião são irreconciliáveis.” — Georg Herwegh, poeta alemão do século 19.

“FILOSOFIA”, palavra derivada de radicais gregos que significam “amor da sabedoria”, é difícil de definir. Ao passo que duvida que se possa dar “uma definição universal e totalmente abrangente”, The New Encyclopædia Britannica (Nova Enciclopédia Britânica) propõe que “uma primeira tentativa nesta direção poderia ser definir filosofia, quer como ‘uma reflexão sobre as variedades da experiência humana’, quer como ‘a consideração racional, metódica e sistemática daqueles tópicos que são de máximo interesse para o homem’”.

Tais definições mostram claramente por que a religião verdadeira e a filosofia são irreconciliáveis. A religião verdadeira baseia-se na revelação divina, e não nas “variedades da experiência humana”. Em primeiro lugar e antes de mais nada, gira em torno dos interesses do Criador, e não em torno dos “tópicos que são de máximo interesse para o homem”. A religião falsa, por outro lado, como a filosofia, baseia-se na experiência humana, e coloca os interesses humanos acima de tudo. Este fato tornou-se especialmente evidente do século 17 em diante, à medida que a cristandade tentava sobrepor-se às mudanças mundiais.

Uma Ameaça Tripla

Logo que a ciência moderna nasceu, no século 17, parecia inevitável um choque entre ela e a religião. Espetaculares avanços científicos envolveram a ciência numa auréola de infalibilidade e de autoritarismo, produzindo o cientismo, uma religião em si, uma vaca sagrada. A luz dos “fatos” científicos, as afirmações religiosas pareciam precariamente destituídas de provas. A ciência era algo novo e excitante; a religião parecia antiquada e insípida.

Esta atitude para com a religião foi intensificada pelo Iluminismo, um movimento intelectual que varreu a Europa nos séculos 17 e 18. Destacando o progresso intelectual e material, rejeitava tanto a autoridade como a tradição política e religiosa em favor do raciocínio crítico. Este, supostamente, era a fonte do conhecimento e da felicidade. “Suas raízes ancestrais”, afirma The New Encyclopædia Britannica, encontravam-se “na filosofia grega”.

O Iluminismo era mormente um fenômeno francês. Líderes destacados da França incluíam Voltaire e Denis Diderot. Na Grã-Bretanha, encontrou porta-vozes em John Locke e em David Hume. Seus defensores também podiam ser encontrados entre os pais da pátria dos EUA, inclusive Thomas Paine, Benjamim Franklin e Thomas Jefferson. Com efeito, a separação de Igreja e Estado, exigida pela Constituição dos EUA, é um reflexo das idéias do Iluminismo. Membros notáveis na Alemanha eram Christian Wolff, Emanuel Kant e Moisés Mendelssohn, avô do compositor Félix Mendelssohn.

Diz-se que Kant, suspeitoso da religião, definiu “Iluminismo” como “a liberação, do ser humano, da tutela auto-imposta”. Com isto, explica Allen W. Wood, da Universidade de Cornell, Kant queria dizer “o processo pelo qual os indivíduos humanos ganham a coragem de pensar por si mesmos sobre a moral, a religião, e a política, em vez de suas opiniões lhes serem ditadas pelas autoridades políticas, eclesiásticas ou bíblicas”.

Na segunda metade do século 18, iniciou-se a Revolução Industrial, primeiro na Grã-Bretanha. A ênfase passou da agricultura para a produção e fabricação de bens, com o auxílio de máquinas e de processos químicos. Isto transtornou uma sociedade principalmente agrícola e rural, fazendo com que milhares de pessoas se apinhassem nas cidades, em busca de trabalho. O resultado foram os bolsões de desemprego, escassez de moradias, pobreza e vários males relacionados com o trabalho.

Conseguiria a cristandade enfrentar esta ameaça tripla da ciência, do Iluminismo e da indústria?

Removendo Deus, Ainda que Bem Brandamente

As pessoas persuadidas pelo modo de pensar do Iluminismo culpavam a religião por muitos dos males da sociedade. A idéia de que “a sociedade deveria ser construída de acordo com modelos pré-fabricados da lei divina e natural”, afirma The Encyclopedia of Religion (Enciclopédia de Religião), “foi substituída pela noção de que a sociedade era, ou poderia ser, construída pelo próprio ‘engenho’ ou ‘imaginação’ do homem. Um humanismo secular e social veio assim a existir, o qual, por sua vez, geraria a maioria das teorias filosóficas e sociológicas do mundo moderno”.

Estas teorias incluíam a “religião civil” advogada pelo influente filósofo francês do Iluminismo, Jean-Jacques Rousseau. Centrava-se na sociedade e no envolvimento humano nos interesses dela, em vez de num Ser divino e na sua adoração. O memorialista francês Claude-Henri de Rouvroy advogava um “Novo Cristianismo”, ao passo que seu protegido Augusto Comte falava de uma “religião da humanidade”.

Em fins do século 19, desenvolveu-se entre os protestantes o movimento americano conhecido como evangelho social; estava intimamente relacionado com as teorias européias. Essa idéia, com embasamento teológico, asseverava que o principal dever dum cristão é o envolvimento social. Encontra grande apoio entre os protestantes, até os dias de hoje. As versões católicas podem ser encontradas nos padres-operários, da França, e entre os clérigos da América Latina que ensinam a teologia da libertação.

Os missionários da cristandade também refletem tal tendência, como uma notícia publicada na revista Time, de 1982, indica: “Entre os protestantes, houve uma mudança no sentido de maior envolvimento nos problemas básicos, sociais e econômicos, do povo. . . Para um crescente número de missionários católicos, a identificação com a causa dos pobres significa advogar mudanças radicais nos sistemas políticos e econômicos mesmo que tais mudanças estejam sendo promovidas por movimentos revolucionários marxistas. . . . Deveras, há missionários que crêem que a conversão é fundamentalmente irrelevante à sua verdadeira tarefa.” Tais missionários evidentemente concordam com o sociólogo francês Émile Durkheim, que certa vez sugeriu: ‘O real objeto da adoração religiosa é a sociedade, e não Deus.’

Obviamente, a cristandade estava removendo Deus da religião, ainda que brandamente. No ínterim, outras forças também operavam.

Substituir Deus por Pseudo-religiões

As igrejas não tinham soluções para os problemas criados pela Revolução Industrial. Mas as pseudo-religiões, produtos de filosofias humanas, afirmavam que tinham, e rapidamente passaram a preencher o vácuo existente.

À guisa de exemplo, algumas pessoas acharam que seu objetivo na vida era a busca de riquezas e de bens, uma tendência egotista promovida pela Revolução Industrial. O materialismo tornou-se uma religião. O Deus Todo-poderoso foi substituído pelo ‘Todo-poderoso Dólar’. Numa peça de George Bernard Shaw, um personagem faz alusão a isso, exclamando: “Sou milionário. É a minha religião.”

Outras pessoas se voltaram para os movimentos políticos. O filósofo socialista Friedrich Engels, colaborador de Karl Marx, profetizou que o socialismo substituiria com o tempo a religião, assumindo ele próprio atributos religiosos. Assim, à medida que o socialismo ganhava terreno por toda a Europa, afirma o aposentado Professor Robert Nisbet, “um elemento destacado era a apostasia dos socialistas, quer do judaísmo quer do cristianismo, e recorrem a um substituto”.

O fracasso da cristandade em enfrentar as mudanças mundiais permitiu o desenvolvimento de forças às quais a World Christian Encyclopedia (Enciclopédia Mundial Cristã) refere-se como “secularismo, materialismo científico, comunismo ateu, nacionalismo, nazismo, fascismo, maoísmo, humanismo liberal e inúmeras pseudo-religiões construídas ou fabricadas”.

Em vista dos frutos produzidos por tais pseudo-religiões filosóficas, pareceriam muitíssimo apropriadas as palavras do poeta britânico John Milton: “Tudo isso é sabedoria vã, e falsa filosofia.”

Procurando Uma Solução Conciliatória

Colhidas entre ineficazes sistemas eclesiásticos, de um lado, e enganosas pseudo-religiões do outro, milhões de pessoas procuravam algo melhor. Alguns acharam que o tinham encontrado numa forma de deísmo, também conhecida como “religião natural”. Granjeando destaque especialmente na Inglaterra, no século 17, o deísmo tem sido descrito como solução conciliatória que abraçava a ciência sem abandonar a Deus. Os deístas eram, por conseguinte, livres-pensadores que seguiam um proceder intermediário.

O autor Wood esclarece: “Em seu significado principal, o deísmo significa a crença num único Deus e numa prática religiosa fundada unicamente na razão natural, em vez de na revelação sobrenatural.” Mas, por descartar a “revelação sobrenatural”, alguns deístas foram ao ponto de rejeitar quase que totalmente a Bíblia. Nos dias atuais, o termo raramente é usado, embora cristãos professos que rejeitam a autoridade eclesiástica ou bíblica em favor da opinião pessoal, ou de filosofias alternativas de vida, estejam, em realidade, aderindo a seus princípios.

Teorias Paralelas da Evolução

O confronto mais dramático entre a religião e a ciência ocorreu depois da publicação, em 1859, de A Origem das Espécies, de Darwin, em que ele propôs sua teoria da evolução. Os líderes religiosos, especialmente na Inglaterra e nos Estados Unidos, de início condenaram tal teoria em termos fortes. Mas a oposição logo se desvaneceu. Já na época da morte de Darwin, afirma The Encyclopedia of Religion, “a maioria dos clérigos refletivos e expressivos tinham chegado à conclusão de que a evolução era inteiramente compatível com o entendimento esclarecido da escritura”.

Isto talvez explique por que o Vaticano jamais colocou os livros de Darwin em seu Índice Expurgatório [de Livros Proibidos]. Talvez também explique a reação da assistência na conferência de Chicago, EUA, de 1893, do Parlamento das Religiões do Mundo. Enquanto os budistas e os hinduístas ouviam, um orador “cristão” disse: “A teoria da evolução preenche uma lacuna do próprio início de nossa religião, e, se a ciência está satisfeita de modo geral com sua teoria da evolução como o método de criação, concordância é uma palavra fria com a qual aqueles, cujo negócio é conhecer e amar os caminhos de Deus, devem acolhê-la.” Tal declaração foi, alegadamente, muito aplaudida.

Não é surpreendente tal atitude, em vista da popularidade gozada em fins do século 19, daquilo que se tornou conhecido como religião comparativa. Tratava-se dum estudo científico das religiões do mundo, visando determinar como diferentes religiões se inter-relacionam e como elas vieram a existir. O antropólogo inglês John Lubbock, por exemplo, expressou a teoria de que os humanos começaram como ateus e então, progressivamente, evoluíram através do fetichismo, a adoração da natureza, e o xamanismo, antes de chegarem ao monoteísmo.

No entanto, como explica The Encyclopedia of Religion: “A religião, em tal conceito, não era uma verdade absoluta, revelada pela deidade, mas o registro de concepções humanas em desenvolvimento a respeito de Deus e da moral.” Assim, aqueles que aceitavam tal teoria não tinham dificuldade alguma de aceitar o deísmo, uma “religião civil” ou uma “religião de humanismo” como degraus que conduziam ao alto, na escada da evolução religiosa.

Em última análise, ao que tal conceito os leva? Já no século 19, o filósofo inglês Herbert Spencer disse que a sociedade entrava num arcabouço de progresso não mais compatível com a religião. E, a respeito do século 20, o Professor Nisbet comentou que os sociólogos em geral crêem que a religião “satisfaz certas necessidades psicossociais dos seres humanos, e até, ou a menos que, tais necessidades sejam eliminadas pela evolução biológica da espécie humana, a religião, de uma forma ou de outra, continuará sendo uma realidade persistente da cultura humana”.  Assim sendo, os sociólogos não estão descartando a possibilidade de que o “progresso evolucionário” passa, algum dia, resultar em nenhuma religião!

Intensificada a Busca da Religião Verdadeira

Já em meados do século 19, tornou-se óbvio que, por cerca de 200 anos, a cristandade estivera travando uma batalha perdida contra as mudanças mundiais. A sua religião tinha-se degenerado em pouco mais do que uma filosofia mundanal. Milhões de pessoas honestas estavam preocupadas. A busca da religião verdadeira se intensificou. Poder-se-ia dizer, verdadeiramente, que era impossível reformar a cristandade. O que se precisava era da restauração da adoração verdadeira. Informe-se mais sobre isso em nossa edição de 22 de outubro.


As especulações jamais provadas de Darwin, em A Origem da Espécies, tornaram-se o pretexto para que muitos abandonassem a crença no Deus da revelação.

Pressionada Pelas Mudanças Mundiais, a Cristandade Transige

  O APARECIMENTO DA CIÊNCIA MODERNA enfraqueceu a fé no invisível e gerou dúvidas sobre as coisas que a ciência não conseguia “provar”. A cristandade transigiu quanto à verdade bíblica por adotar teorias supostamente científicas, não comprovadas, como a evolução, e por encarar o conhecimento científico, em vez de o Reino de Deus, como a panacéia para os problemas mundiais.

  O DESPONTAR DE IDEOLOGIAS POLÍTICAS (capitalismo, democracia, socialismo, Comunismo, e assim por diante) gerou conflitos nacionalistas e embates ideológicos, obscurecendo assim a verdade bíblica de que Deus, e não o homem, é o legítimo Governante da Terra. A cristandade transigia quanto aos princípios bíblicos, por violar a neutralidade cristã e ficar envolvida em guerras que lançaram os membros da mesma religião uns contra os outros. A cristandade, de modo ativo ou passivo, apoiou as pseudo-religiões políticas.

  O PADRÃO MAIS ALTO DE VIDA, tornado possível mediante as Revoluções Industrial e Científica, promoveu o egotista interesse próprio e trouxe a lume a injustiça e a desigualdade sociais. A cristandade transigiu nisto, por negligenciar os interesses divinos em favor de envolver-se nos interesses humanos de natureza social, econômica, ecológica ou política.


Progride ou Regride?

  A Bíblia diz: Os humanos foram criados perfeitos e lhes foi ensinado como adorar o Criador de forma aceitável; mas eles se rebelaram contra Deus, e, por cerca de 6.000 anos, têm degenerado, tanto física como moralmente, afastando-a cada vez mais da religião verdadeira que originalmente praticaram.

  A evolução biológica e religiosa diz: Os humanos evoluíram a partir de um começo primitivo e eram ateus, sem ter qualquer religião; por indizíveis milhões de anos, eles melhoraram tanto física como moralmente, chegando cada vez mais perto dum estado utópico desenvolvimento religioso, social e moral.

  Com base no que o leitor sabe sobre o comportamento humano, sobre a condição da humanidade, e sobre a condição da religião no mundo atual, qual destes conceitos lhe parece mais coerente com os fatos?